Publicado em: 16 de fevereiro de 2018
Uma das sobreviventes do ataque é a estudante brasileira Kemily dos Santos Duchini, de 16 anos, que vive com a família na cidade de 30 mil habitantes há quatro anos e desde 2016 cursa o ensino médio na escola que nesta quarta-feira (14) foi alvo do atentado.
Kemily disse nunca antes ter se preocupado com a questão do controle de armas no país “não era nem contra, nem a favor”, mas agora que viu de perto o resultado do fácil acesso às armas de fogo e munição, acredita que deve haver maior regulação.
Já o pai de outros dois alunos da escola, o empresário brasileiro Luís Eduardo Girão, também questionou a facilidade de acesso às armas no país. “As coisas acontecem na vida para tirarmos algum aprendizado. Pra mim, está claro que essa liberdade na compra de armas de fogo, assim como querem permitir no Brasil, é a pior coisa que pode acontecer”, disse em entrevista ao jornal O Povo, ao comentar o atentado.
O responsável pelo atentado portava um fuzil AR-15 e, de acordo com a polícia, tinha “muita munição para armas semiautomáticas”.
Em depoimento à BBC Brasil, Kemily conta com detalhes como foi a chegada do atirador na escola, a reação dela e dos colegas de sala, o cuidado que a professora teve com os alunos e a pouca sensibilidade da polícia ao fazer o resgate.
Ela destaca que depois de conter o atirador, os policiais arrombaram a porta da sala de aula aos gritos “com armas enormes”, num momento em que os adolescentes já estavam em pânico. E ao final do relato, a estudante questiona a pouca regulação ao acesso às armas no país.
“Eu nunca tinha prestado atenção em gun control (controle de armas), achava que não tinha a ver comigo. Mas, agora que bateu na minha escola e aconteceu comigo, a gente vê de um jeito diferente. Esse menino provavelmente não tinha idade para ter uma arma. Depois soubemos que ele foi expulso da escola porque encontraram balas na mochila dele”.
Leia o depoimento na íntegra:
“Eu estava em um prédio chamado Freshment Building, que foi o primeiro onde ele entrou. Estávamos fazendo tarefa e a primeira coisa que escutamos foram quatro tiros e barulhos altos, como se alguém estivesse jogando algo muito pesado no chão.
Nós ouvíamos homens gritando e não entendíamos. Os tiros estavam se aproximando da minha sala. Eu estava no segundo andar e percebia que estava subindo as escadas, chegando cada vez mais perto.
Então ouvimos: “Ponha as mãos na cabeça!”. Era a polícia falando com alguém.
Mas continuamos ouvindo muitos tiros depois disso.
Enquanto tudo acontecia, a escola não fez nenhum aviso no sistema interno de alto-falantes. O sinal do fim da aula também não tocou.
Às 15h, bateram na porta da sala de aula dizendo que era a polícia. Por protocolo, regra da escola nesse tipo de situação, nós não podíamos abrir.
Então eles quebraram a janela, pediram para todos colocarem as mãos na cabeça e começaram a fazer perguntas. “Tem alguém armado?” “Tem alguém ferido?”
Eles pediram para todos nós sairmos com as mãos nos ombros das pessoas da frente. Lá fora, eram mais de dez homens da SWAT com armas enormes gritando para nós: “Corram!”, “Andem rápido!”, “Não olhem para trás!”.
O policial disse para não olharmos, mas uma amiga virou e viu uma menina morta no chão.
Nessa hora eles pediram para colocarmos as mãos na cabeça. Andamos até a esquina da escola e lá fora encontramos a polícia, e pais e mães chorando.
Encontrei uma amiga do terceiro andar, onde aconteceu a maior parte da destruição. Ela contou que viu quatro mortos – duas meninas caídas na entrada do banheiro.
No primeiro e no terceiro andares, os banheiros estavam trancados e elas não conseguiram entrar.
Todos os tiros foram na cabeça.
Eu estava calma. Não sou muito de ficar desesperada. As meninas todas choravam, tremiam muito.
A professora estava muito preocupada, você via na cara dela. Mas ela fazia de tudo para nos tranquilizar e dizia que o que estava acontecendo era um tipo de teste, uma encenação. Isso acontece às vezes.
Eu mandava mensagens para a minha mãe enquanto os tiros aconteciam. Eu dizia que estava bem, mas não conseguia escrever o tempo todo porque a professora mandou não usarmos os celulares.
Ela falava para ninguém mandar mensagens, mas estava todo mundo desesperado.
Recebi uma foto de uma menina lá fora na ambulância e um vídeo com um corpo ensanguentado em outra sala de aula.
Não mostrei para os meus colegas porque eles já estavam muito desesperados.
Na minha sala ninguém gritou excessivamente ou fez escândalo. Mas soube que em outra sala teve um menino que teve um ataque de pânico muito forte.
O encontro com a minha mãe foi muito bom. Ela estava muito feliz por me encontrar bem.
O que fica dessa experiência? Bom, eu nunca tinha prestado atenção em gun control (controle de armas), achava que não tinha a ver comigo.
Mas, agora que bateu na minha escola e aconteceu comigo, a gente vê de um jeito diferente. Esse menino provavelmente não tinha idade para ter uma arma. Depois soubemos que ele foi expulso da escola porque encontraram balas na mochila dele.
Eu não era antes contra o controle. Nem contra nem a favor. Agora eu acho que tem que ser mais regulado.”
Do Portal Vermelho, com informações da BBC Brasil e O Povo