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Distorções no MEI resultam em financiamentos bilionários do INSS


Publicado em: 18 de janeiro de 2018


Coordenador do Ipea projeta necessidade de financiamento de pelo menos R$ 464,7 bilhões, entre 2015 e 2060 na Previdência  

 LILIAN MILENA
Foto: Agência Brasil
Jornal GGN – Um estudo divulgado nesta quarta-feira (17) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) revelou que o programa Microempreendedor Individual (MEI) pode gerar uma necessidade de financiamento de, pelo menos, R$ 464,7 bilhões a R$ 608 bilhões, entre 2015 e 2060 no INSS. As razões são duas: a alíquota baixa cobrada dos beneficiários do plano e a inadimplência.
O MEI foi criado pela Lei Complementar n° 128/2008 para facilitar a formalização do trabalhador por conta própria. Começou direcionada para microempreendedores com faturamento anual máximo de até R$ 36 mil, posteriormente elevado para R$ 60 mil. Em 2018, o limite de faturamento aumentou para R$ 81 mil/ano. A regra substitui o CNPJ e exige o pagamento de uma taxa mensal de cerca de R$ 50 que corresponde a R$ 1 de ICMS ou R$ 5 de ISS, dependendo da atividade, e 5% do salário mínimo.
Segundo o autor da nota técnica, Rogério Nagamine, coordenador de Seguridade Social do Ipea, essa alíquota é muito inferior as alíquotas cobradas de outras categorias (20% para empregados com carteira ou do plano completo), além disso atende hoje uma faixa com faturamento bastante superior a realidade geral da população brasileira.
“Na prática, está se dando o benefício previdenciário quase de graça para trabalhadores que teriam capacidade para contribuir, inclusive, com planos equilibrados do ponto de vista atuarial. Certamente um trabalhador que tem um faturamento de R$ 81 mil/ano teria capacidade para contribuir para a previdência com valor superior a 5% do salário mínimo, bem como se trata de um nível de renda elevado para os padrões de renda brasileiros”, argumenta.
Em dezembro de 2017 o programa contava com 7,7 milhões de inscritos, mas elevada inadimplência, segundo o autor trabalho. Para chegar ao calculo de que o programa irá gerar a necessidade financeira de pelo menos R$ 464,7 bilhões ao INSS nas próximas décadas, Nagamine considerou os beneficiários que fizeram, pelo menos, uma contribuição em 2014 considerando o cenário do salário mínimo em valores presentes (213 bilhões a R$ 272 bilhões).
Inadimplência
O coordenador do Ipea levanta também que, no final de 2015, havia cerca de 5,7 milhões de inscritos no programa, mas os dados Anuário Estatístico da Previdência Social mostraram que 3,357 milhões deles haviam contribuído pelo menos uma vez naquele ano, elevando a estimativa de inadimplência para 40,9% dentro do MEI. “Considerando adimplente aquele com pelo menos uma contribuição no ano”, pontua o autor.
Outro fator que reforça o impacto nas contas do INSS é a expectativa de sobrevida. Por exemplo o caso de uma mulher que tenha cumprido o mínimo de 15 anos de contribuição e se aposentado pelo MEI aos 60 anos. A expectativa de sobrevida hoje para ela é de 23,8 anos, portanto passaria mais tempo recebendo aposentadoria do que contribuindo. Usando como base os valores presentes, essa mulher proporcionaria uma arrecadação de R$ 6,9 mil e teria R$ 135,6 mil de benefício cobrindo apenas 5,1% das despesas do INSS.
Nagamine também salienta que, em 2014, o grau de ensino superior entre os beneficiários do MEI era superior aos empregados com carteira assinada: 16,2% contra 14,8%. Esse percentual caia para 10,2% entre os trabalhadores por conta própria e fora do MEI.
“O indício que os MEI têm uma escolaridade superior à dos conta própria e muito similar a dos empregados com carteira parece reforçar a preocupação que, em algum grau, o MEI pode estar estimulando a chamada “pejotização” e a migração de empregados formais para MEI, com efeitos negativos sobre o financiamento da previdência social” analisa o autor completando: “Também é possível que trabalhadores que teriam condições de se inserir no mercado de trabalho como empregados com carteira estão se inserindo como MEI”.
Para acessar o relatório completo do coordenador de Seguridade Social do Ipea, Rogério Nagamini, clique aqui. 
O programa Microempreendedor Individual dá ao contribuinte o direito a um número de CNPJ, acesso a linha de crédito, emissão de nota fiscal, aposentadoria por idade, auxílio-doença e salário maternidade.
O trabalho também analisou o impacto Plano Simplificado de Previdência Social (PSPS), outro modelo inclusão previdenciária que reduz o percentual de contribuição de 20% para 11%. Os desequilíbrios proporcionados por esse programa de 2015 a 2060, segundo Nagamine, pode gerar do INSS necessariedades de cobertura entre R$ 927,5 bilhões a R$ 1,179 trilhão (respectivamente, R$ 467,1 bilhões a R$ 576,6 bilhões em valor presente).
A título de comparação, os gastos com o INSS em 2014 se estabilizaram em R$ 388 bilhões, com arrecadação líquida de R$ 333 bilhões e financiamento do restante (R$ 54,5 bilhões) por outras fontes do governo.  Em 2015, o déficit da previdência aumentou para R$ 58 bilhões em resposta a políticas que, ao contrário de combater a crise, reforçaram o estado de retração do setor privado e consequentemente o aumento do desemprego resultando em menos pessoas ocupadas contribuindo com a Previdência. Com isso, o peso do INSS dentro dos déficits primários saiu de 0,8% em 2011 para 2,4% do PIB em 2016.