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Tráfico internacional de mulheres: Não ao sexo rei


Publicado em: 7 de fevereiro de 2018


Fabiana Machado*

O dito e o não dito sobre o tráfico internacional de crianças, meninas e mulheres para a prática de exploração sexual formam os elementos constitutivos deste breve artigo, o qual busca analisar, refletir e criticar este crime de natureza monstruosa. Porém, não se pode prosseguir sem antes avisar ao leitor que o crime de tráfico internacional de pessoas abrange várias modalidades de exploração, mas a finalidade aqui é discutir somente o tráfico de pessoas para prostituição.

Voltando um pouco no tempo, o tráfico de pessoas, sobretudo de mulheres, para fins de exploração sexual surgiu na antiguidade, mais ou menos por volta dos anos 3.000 a.C. A questão da comercialização de pessoas sempre foi coroada pelo objetivo da alta lucratividade, nisso esta prática criminosa também pode ser deduzida do interesse econômico. Do ponto de vista aqui assumido, o tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual está tête-à-tête com o poder constituído do contrabando de armas e de drogas.

O outro sentido da concepção do tráfico de pessoas para prostituição, o qual faz das mulheres suas maiores vítimas, encontra-se na desigualdade de gênero, haja vista a dominação e o poder dos homens sobre as mulheres gerarem uma mentalidade social, cultural e interpessoal machista, sexista e misógina. Sendo assim, a violência de gênero se constitui nas vantagens, privilégios e superioridade dos homens às custas da escravidão, opressão, humilhação e supressão dos direitos humanos das mulheres.

O porquê das meninas e mulheres serem recrutadas pelos traficantes, encontra-se na posição social das vítimas como, por exemplo, pobreza, miséria, desemprego, baixo grau de escolaridade e violência infrafamiliar, bem assim nas leis deficitárias, as quais não são fortes o suficiente para coibir este crime horripilante. Aí estão as raízes e os fundamentos da existência e manutenção da escravidão sexual, pois os aliciadores seduzem as suas vítimas com promessas de empregos, inclusive com salários compensatórios para atuarem como modelos, dançarinas, garçonetes, baby-sitters, trabalhos artísticos, acompanhantes e etc.

Tradicionalmente, no caso brasileiro, o crime de tráfico de pessoas para exploração sexual envolve o turismo sexual, a prostituição infantil, a pornografia infantil, a prostituição forçada de mulheres, a escravidão sexual, o casamento forçado, de modo que estes crimes guardam relação direta com a pobreza, desigualdade de gênero, exclusão social, violência contra a mulher, vulnerabilidade das vítimas, baixo grau de instrução, desemprego, corrupção política, crime organizado, globalização, alta lucratividade do comércio de pessoas, leis deficientes e precárias, impunidade dos traficantes e similares. Daí a ideia que se espalha de que o tráfico de crianças, meninas e mulheres para exploração sexual no Brasil é crime corriqueiro, comum e de fácil execução, porém pouco ou nada enfrentado, em razão do descaso do Poder Público.

De uma maneira geral, depois que as vítimas são traficadas, seus documentos são tomados, elas são tratadas como objetos, animais, são mantidas em cárcere privado, são espancadas, estupradas, são obrigadas a manterem de 15 a 20 relações sexuais por dia, são ameaçadas de morte e vivem o tempo todo vigiadas. Sem conseguirem modificar esta relação violenta e sem terem a quem apelar, muitas vítimas se suicidam. Em todo caso, em razão da violência física, psicológica, sexual, moral e patrimonial constantes e da brutal precariedade de vida, as vítimas possuem uma sobrevida inferior a 04 anos, pois elas são exploradas sexualmente até a exaustão, são vítimas de overdose, contraem doenças infecto contagiosas e morrem à míngua.

Somente a título de maior esclarecimento, boa parte dos traficantes de meninas e mulheres para exploração sexual pertence à classe média e alta, vez que são proprietários de boates, bares, agências de moda, agências de turismo, políticos, funcionários públicos, grandes empresários, dentre outros. Esta organização criminosa transnacional também se opera pela internet, via de regra pelos meios de comunicação social. Dessa forma, considera-se imprescindível alertar as adolescentes e jovens sobre a existência do aliciamento dos traficantes, os quais atuam preferencialmente recrutando meninas das classes desfavorecidas.

Neste aspecto, a prática do comércio de crianças, meninas e mulheres para prostituição é ilegal, desumana, absurda e o Estado e a sociedade devem promover o enfrentamento, a investigação e a punição rigorosa dos traficantes, nos termos das normas do Protocolo de Palermo, ratificado pelo Brasil por meio do Decreto nº 5.017, de 12/03/2004. Assim, é preciso prevenir o tráfico de meninas e mulheres instituindo políticas públicas eficientes, programas de conscientização da população e sobretudo dispositivos de proteção das vítimas.

*Fabiana Machado. Advogada. Professora Universitária. Poeta. Especialista em Filosofia Contemporânea pela Universidade Estadual de Feira de Santana/BA. Ideóloga do Projeto Versos de Mulher.